sábado, 31 de janeiro de 2009

Reencontro

Seus olhos, por que me estranham tanto?
Sinto o confiscar do sorriso prisioneiro dos lábios meus.
Os mesmos pés que da labuta fizeram uma constante
Repousam agora diante do alvo afetivo.

Seus olhos, por que me estranham tanto?
Se por vezes naveguei em seu brilhar.
Julgo ingrata a condição que me arrastou para longe.
E confesso ter preenchido meus dias com lembranças suas.

Seus olhos, por que me estranham tanto?
Por sob as marcas que o tempo esculpiu em minha face
Encondem-se a nódoas de um contrariado romance.
Um derradeiro que jamais encostará
Na rotina de quem perde os sentidos.


Ah! Por que me estranhas tanto?
Se nas noites fiz razão surgir da idolatria.
Tracei planos de fuga para libertar-me do evasivo.
E jurei descansar apenas quando fizesse
De seus olhos, um refúgio para os meus.

quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Sorriso de Ouro (ou de menina)

Raptei o teu sorriso.
Fiz do meu peito, um cativeiro.
Oh! Que ato impreciso.
Te queria por inteiro.

Cativeiro, não é bem.
Subjulgo uma morada.
Com o brilhar de teu sorriso
Pagarás pela entrada.

Semântica

Felicidade: bom êxito; ventura; bem-estar.

Bom êxito: resultado feliz.

– Se você me faz feliz, meu maior êxito é você.

Corrigindo

Felicidade: você; ventura; bem-estar.

Ventura: sorte.

– Não há sorte maior que a de te conhecer, moça.

Corrigindo

Felicidade: você; você; bem-estar.

Bem-estar: conforto.

– Se tanto me confortas, meu conforto é você.

Corrigindo

Felicidade: você; você; você.

Corrigindo

Felicidade: VOCÊ.

quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

Testemunho

Vi-o partir. Contraditórias lágrimas estamparam meu peito. Não porque se foi. Pela crueldade, porém. Não me atrevo a tracejar o íntegro decurso. Nem poderia arriscar-me. A comoção se encarregaria de me roubar as minúcias. Arrastaria-me a sendas discrepantes da fiel. A mesma comoção que outrora me fez correr a vista para o remoto distante daquele bárbaro tormento de quem, agora cogitando, já não pressinto ser tratante de análogo massacre. Porventura, as legítimas e divinas autoridades se fariam corpulentas ao vassalo submisso às normas do alheio sítio. Triste sentença a que alcanço. Antes nunca que tardio.
Como por um resquício de dolo, o posseiro da crua e frígida perversão resume sua atitude a simplesmente sagrar o derradeiro ponto para aquele que, de todos, o fez sedento de desforra. Não havia cobiça em espectar o sofrer do outro. O sofrer agudo e notado com mais ímpeto no instante em que se pôs a descansar o punhal na marcada e tensionada lacuna entre duas costelas do sujeito sem muito tempo de vida. Covarde! Era sim um covarde. Diria mais: um oportunista... covarde. Sujeitou-se a desonra de atritar-se com um homem, estando este focinhado para o mesmo norte de seu algoz. Sua extinção, e apenas sua extinção ascenderia o gozo de quem, antes posseiro de angústia e revanche, executou a ação de um delituoso. De fato, era também aquele, um delituoso. Bem-aventurados os amantes do eufemismo! Pois jamais me atreveria a julgar Assassino o que decretou pena fatal a algum fulano.
Manchava-se de rubro a estaca e a visão dos sofríveis senhores. Em lar de reflexões do soberano instantivo, abrigavam-se as multicolóricas lembranças dum pretérito de distância escassa da angustiante ocasião. Na verdade, viam-se ali exclusivos matizes de feições trevas e cândidas. Digressões de uma felonia sem figurantes. A não ser o espelho, o abajur, o inquieto raio de uma vela pertinaz à pretensão da brisa que invadia, por entre a cortina cor-de-carne, o espaço censurado. Enfim, tudo aquilo que dividia o espaço entre quatro paredes com a silhueta de um casal pecador. Os capitais artistas da citada traição eram a, não mais atual, senhora do coração daquele amargurado indivíduo e seu brother como, por vezes, se pôs a referir-se do contemporâneo jovem das épocas colegiais.
Nada mais pôde fazer o suposto justiceiro. Não diante do terreno corado e decorado com um corpo já em estado cadavérico. Apressou-se, então. E seu rastro, descomplexado por impressões abandonadas no panorama homicida, julgou irrelevante sonegar. Com o ruinoso par combalido, corria apenas o júbilo pelos antros do atraiçoado. Não se deixava cogitar a respeito das severas repreensões que lhe fariam fado.
Certamente, não poderia eu lançar-me a meticulosa descrição de uma mente sádica, se por dias e dias não estivesse pregado a um brilhante plano fatal, que por sinal, concretizou-se desprovido da elegância sombreada dentro de minha caixa pensante. Profiro o que é de meu conhecimento e confesso: matei.

terça-feira, 20 de janeiro de 2009

Seu Olhar

Seu olhar é nevoeiro.
De tão doce, sua mel.
Quando vem o aguaceiro
Nevoeiro cheira a fel.

Seu olhar é aquarela.
Colorido no papel.
Se figuro a primavera
Te avisto no alvo céu.

Seu olhar é meu alento.
Uma dádiva sinal.
Faço dele meu sustento.
De sua glória, um carnaval.

segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Lá no Beco...

Lá no beco é diferente.
Sou tratado como gente.
Cresço a vida sempre crente.
Creio num mundo decente.

Lá no beco é diferente.
Passo o tempo sorridente.
Brincadeira inocente.
Meu olhar é reluzente.

Lá no beco é diferente.
A tristeza é sempre ausente.
Do vizinho ao descendente
Não há paz que se agüente.

E se alegria, de repente
Não vier tão envolvente
Tranqüilizo. Sigo em frente.
Torço apenas pra que aumente.
Eu sei não é tão simplesmente.
Mas lá no beco é diferente.

sábado, 17 de janeiro de 2009

Súplica

Desdenho de meu encanto.
Sublinho o meu suplício.
Disparo ao certo santo:
"Cambaia esse meu vício!"

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

Chagas

Na marola jornante, avisto a insista revolta de uma dócil sentimental, que, embora já não alheia ao anfitrião por escolha ou contrária falta desta, jamais se tornou capaz de nominar ou descrever, aquela que certos leigos, por ampla ousadia, puseram-se a bradar, com seu insensível vigor, paixão.
A tal, desconheço porque diabos, não se faz notar banhada de solidão. Consigo, o cheiro, o olhar, o aveludado e vocal tom de uma lânguida pudica que estreito dista da alma dum frustrado suspeito a declamar o acato imposto pelas arbitrárias normas da crônica visitante. O faz mesmo no auge de sua gênera ignorância. Sim! É ignorante aquele que cogita ser profundo conhecedor do outro, visando apenas suas observações do que pode, perfeitamente, condicionar a seleta face do indivíduo manchado de males paradoxais ao espectro visível. Insensatez a que me guiou a palavras tais! Descrevo, acidentalmente, a mesma ignorância que, há tempos, me assola. Impregnante! Impugnante!
De seus denotados acréscimos nunca se difundiram minhas vistas enfadadas de tanto cachoeirar as gotículas de uma passagem antagônica a que jurei autoespectar. Uma passagem corriqueira que, por vezes, fez sangrar o decrépito coração de quem, inclinado a idolatria, recorre ao ardor, mesmo quando se desvaira. Entre o sublime caminhar de uma persona, abrange o indiscreto embrasar compassivo do que jurei pairar benevolência. De fato, fez-se de afeição o sentimento que se entortou como a rosa espinhelhada, isentando-se apenas das nódoas exteriorizadas que perduram na derme do jardineiro. Não me arremesso à desventura de abordar discrepância entre a ferida rosácea e a do peito, na baldia e respectiva visibilidade coesa e distante do fato proposto. Pecaria como aquele que não ponderou como chaga, o profundo desgosto do apaixonado que espera arduamente pela simbiose à alma cândida de uma donzela que, apenas em surreais devaneios, render-se-ia aos encantos do agônico adepto.

segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

Assassínio Ilusório

Pondo-me, simplesmente, a buscar rechear a mente com algo que me proporcionasse certo prazer, acabei por me perder em mirabolantes ilusões sem precedentes, sem pé e, provavelmente, sem cabeça. De maneira inentendível, vi-me em um interrogatório pessoal e extremamente íntimo sobre assuntos de que, nem por decreto, me fará os explicitar. Citarei somente o que me deixou, como diria o outro, cabreiro. Acredite: questionei-me a respeito de quem faria padecer, ou mesmo falecer, graças a disparo procedente de letal máquina minha. Não minha como um de meus CDs ou mochila. Apenas de posse temporária; somente naquele azado instante. Deixo claro que pensamentos tais não me trouxeram a um estado de prazer; pelo contrário, senti-me sufocado e angustiado pelo simples fato de, mesmo em imaginação, cometer o trágico delito. Embora, o disparo pudesse ocorrer com máxima isenção de culpa e, conseqüente abnegação de qualquer punição proveniente das leis humanas, divinas ou até mesmo aquelas... do inferno, executar o procedimento tal como o de um assassino, deixava-me puramente inexprimível, por mais que aquele ocorresse apenas no distante imaginário. Mesmo no descrito estado, analisei categoricamente as supostas vítimas da maldade, fruto de minhas atitudes. Creio que estás a pensar que em lista de meus prováveis procurados, os encontrará em extenso número; provavelmente um tanto entre dez e vinte. De fato, não só eu. Todos guardamos no peito a bizarra cobiça de decretar o ponto último na jornada uita de enfadonhos viventes deste ou d’outro posto. Natural ou atípico? Ordinário! Enfim, por aleatória exclusão, chego ao incrível Lugar Nenhum. Há de convir que usar da razão para eleger um defunto não é fácil tarefa. Simplório é tentar despistar-se de miragens do gênero. Já que a trama descrita, com toda a sua escusa e impassibilidade jamais se fará concreta.